Ministro da Educação Vélez Rodríguez (à esquerda), em encontro com o presidente do Senado, David Alcolumbre (DEM-AP) — Foto: Marcos Brandão/Senado Federal |
Carta de Ricardo Vélez a
escolas de todo o país reproduzia frase de campanha de Bolsonaro e previa que
alunos fossem filmados cantando o Hino Nacional. Após repercussão negativa, MEC
divulgou nova versão sem o slogan, e com a previsão de que gravação só seja
feita com autorização.
O ministro da Educação,
Ricardo Vélez Rodríguez, pediu para escolas de todo o país que seja lida uma
carta aos alunos da qual consta o slogan de campanha do presidente Jair
Bolsonaro. A mensagem, enviada por email, também pedia que os alunos fossem
filmados cantando o Hino Nacional. Tratava-se, segundo a mensagem do ministro,
de uma solicitação de "cumprimento voluntário".
Nesta terça-feira (26), após a
repercussão negativa do comunicado, o MEC divulgou uma nova versão, sem o
slogan de campanha de Bolsonaro. O texto também passa a prever que a filmagem
dos alunos seja feita apenas caso haja autorização dos responsáveis (veja a
íntegra das duas cartas ao final desta reportagem).
"Eu percebi o erro, tirei
essa frase, tirei a parte correspondente a filmar crianças sem a autorização
dos pais. Evidentemente, se alguma coisa for publicada, será dentro da lei, com
autorização dos pais", afirmou Vélez, no Senado.
Mas, ainda que seja um pedido,
e não uma determinação, é permitido filmar crianças em escolas? Cantar o hino é
obrigatório? E usar o slogan de campanha?
Veja abaixo o que diz a
legislação brasileira:
Cantar o hino: é obrigatório
uma vez por semana
A execução do hino nacional
nas escolas está prevista em lei. O texto está na lei 5.700 de 1971, sobre a
apresentação de símbolos nacionais:
Art. 39. É obrigatório o
ensino do desenho e do significado da Bandeira Nacional, bem como do canto e da
interpretação da letra do Hino Nacional em todos os estabelecimentos de ensino,
públicos ou particulares, do primeiro e segundo graus.
Em 2009, um parágrafo foi
acrescentado ao artigo:
Parágrafo único: Nos
estabelecimentos públicos e privados de ensino fundamental, é obrigatória a
execução do Hino Nacional uma vez por semana.
Portanto, a execução do Hino
Nacional uma vez por semana é legal para escolas públicas e particulares do
ensino fundamental e médio (a nomenclatura "1º e 2 graus" não é mais
utilizada na educação no Brasil).
Filmar crianças: é proibido
sem autorização
O artigo 17 do Estatuto da Criança
e do Adolescente garante o direito à preservação da imagem. Diz o texto da lei:
Art. 17. O direito ao respeito
consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança
e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da
autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
Portanto, filmar as crianças
sem autorização é ilegal. A autorização deve ocorrer de maneira formal, com
assinatura de documento na escola.
A primeira versão da carta enviada
pelo ministro não previa o pedido de autorização. Essa exigência foi incluída
na segunda versão, divulgada após a repercussão negativa do comunicado inicial.
Essa foi uma das alterações feitas pelo MEC.
Slogan de campanha: pode ferir
a Constituição
O artigo 37 da Constituição
Federal diz que a administração pública de qualquer um dos poderes deve seguir
os princípios da "legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência".
De acordo com o professor
titular de direito constitucional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro
(UERJ) Daniel Sarmento, a interpretação é que o uso do slogan de campanha fere
os princípios da impessoalidade e da publicidade.
"O artigo 37 veta que se
utilize publicidade e atos de governo veiculados a nomes de governantes. Isso
vem sendo interpretado de maneira ampliada também para slogan de campanha. A
ideia é desassociar o estado [poder público] ao nome das pessoas e também
slogans de campanha. Também tem a questão da impessoalidade administrativa, a
separação entre o público e o privado. A lógica da separação do Estado não pode
confundir com a lógica nem do partido, nem de governantes", diz.
Segundo Luciano Godoy,
professor de direito da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, como parte do
slogan tem caráter religioso ("Deus acima de todos") vai também
contra a liberdade religiosa: "O Estado não pode se vincular a nenhum tipo
de religião ou igreja. O Brasil é laico, o Estado não pode impor que as pessoas
acreditem em algo".
Veja a íntegra da primeira mensagem do MEC e a nova mensagem AQUI:
Por:G1